sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Haveria amor, ou só dor? - Rita Reis (*)

Quando a vi estava sentada e cabisbaixa na viela próxima ao rio.

Não era muito jovem, e estava com um ar de muita tristeza.

Ela me chamou com sua voz rouca e eu parei, apesar de estar com bastante pressa.

Voltei meu olhar para aquela mulher assim meio largada ali no meio do nada.

Ela estava também assustada, parecia até alcoolizada, drogada? Será?

Sua voz balbuciava pedidos aflitos, pedidos de ajuda por alimento.

Seus pedidos vinham intercalados com choro, chegou a soltar um grito aflitivo.

Será que a fome lhe trazia dor? Ela não pedia e nem queria dinheiro, queria comida.

Ao olhá-la mais de perto fiquei em dúvida se ela estaria ou não grávida.

E se estivesse, será que seu companheiro saberia de seu estado?

Talvez nem tivesse um relacionamento amoroso, será?

Teria um lar? Haveria alguém de quem ela pudesse também cuidar?

Haveria alguém que se preocupasse com ela? Haveria amor, ou só dor?

Minha passagem por ela teria sido rápida por demais, mas parei.

Há os que não param, há os que não escutam, não enfrentam o problema.

Muitos têm medo do envolvimento e de não saber como lidar com a situação.

O sentimento de preocupação me atingiu, mas fiquei sem ação, já que não trazia alimento.

Não havia também nenhum local para comprar algo por ali naqueles arredores.

Eu estava alimentado e me sentia culpado por não ter nenhum alimento comigo.

Eu teria uma entrevista de emprego agendada ali perto, cortara caminho para chegar mais depressa.

Foi por receio de atrasar em meu compromisso que por pouco não parei.

Mas sou meio mineiro e gosto de chegar bem antes da hora marcada.

Sempre me programo para sair bem mais cedo para não correr o risco de me atrasar.

Eu simplesmente não iria conseguir fazer a entrevista se não ajudasse aquela mulher.

Olhei ao meu redor aflito, precisava fazer alguma coisa e rápido.

Percebi alguns meninos brincando não muito longe dali, e chamei-os.

Eles jogavam bola e vieram correndo ao meu encontro.

Perguntei a eles se tinham algum lanche. Não senhor, responderam.

Estaca zero! A hora passando e eu sem conseguir solucionar o caso.

Expliquei minha situação à mulher e convidei-a então para caminhar comigo.

Será que ela teria forças para fazê-lo? Ela aceitou e seguimos.

Pensei: se não encontrar alimento pelo caminho, vou leva-la à Empresa.

Foi o que fiz. Chegamos lá sem nos depararmos com oferta de qualquer alimento.

Ao chegarmos entrei e pedi um café para a recepcionista, e se possível um suco e um sanduíche.

Ela me olhou assustada e disse que só tinha mesmo café.

Pedi então que ela colocasse bastante açúcar e o dei à mulher que havia ficado lá fora.

Pedi à mulher lá fora que ela me aguardasse e entrei para a entrevista.

Minha surpresa ao entrar foi a recepcionista me entregar um sanduíche. Ela pediu a um colega e este cedeu, assim como uma fruta.

Levei correndo para a mulher lá fora, mas ela já tinha partido.

Talvez o café tenha sido o suficiente para reanima-la!

Fiquei preocupado com sua partida, mas fiquei em paz comigo.

Relaxei, e enfim descansei um pouco antes de meu compromisso.



* Rita Reis, escritora, membro do Grupo Experimental da Academia Araçatubense de Letras (AAL)  

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